Luiz Alberto de Vargas
Por que pagar contribuição sindical? afinal, para que serve o Sindicato?
Em tempos de um irracionalismo egocêntrico, as perguntas parecem fazer algum sentido. Na lógica de um tacanho “toma lá, dá cá”, que desconhece qualquer outro valor do que o econômico e despreza qualquer sentido à solidariedade, contribuir para uma causa coletiva parece significar desperdício e ingenuidade.
Aparecem os astuciosos e conhecidos chavões que, logo, se divulgam massivamente e se reforçam, de forma subliminar, pelos grandes meios de comunicação: “não confie nos outros”; “quem gosta de mim sou eu”; “o mundo é dos espertos”; “para quem trabalha não há crise”; “não seja maria vai com as outras”; “ninguém fala em meu nome”; “quem gosta de política é corrupto ”.
Nesse mundo particular do supremo individualismo da pós-modernidade - supostamente a melhor resposta à complexidade do mundo do século XXI-, a história não tem espaço; o passado parece não fazer sentido; e, por necessária consequência, o próprio futuro parece não ter direção ou sentido.
De fato, se não se sabe de onde se veio, não se entende quem se é; nem para onde se vai. Tudo se dilui em um presente incoerente e caótico, em que até mesmo o “meu interesse” parece, ao mesmo tempo, incerto e injustificado. Pois, quando se desconhece o “interesse dos outros”, perde sentido o próprio indivíduo. Porque, ao contrário do que vemos e ouvimos, diariamente, pelos meios de comunicação, a verdade é que somos todos interdependentes, especialmente no mundo desumanizado deste capitalismo neoliberal.
O futuro do “empreendedor individual” é apenas um mito criado pela propaganda para culpar os próprios trabalhadores pelo fracasso do sistema. Não se pode falar em sucesso individual em meio a um oceano de desempregados e subempregados: é uma ilusão pensar na felicidade própria em meio à tristeza e ao desespero de nossas semelhantes. O bicho-homem é, felizmente, assim: feito de solidariedade e empatia que não lhe permitem ser feliz às custas da infelicidade dos demais. Pensar “eu venço sozinho” é uma falácia. Um absurdo lógico como querer chegar primeiro ao cais estando todos no mesmo barco.
Por outro lado, em realidade, ninguém vence sozinho. Sempre a vitória individual será apenas o coroamento de incontáveis esforços de muitos, a expressão individual de uma vitória que é sempre coletiva.
No mundo cruel em que vivemos, para um “vencedor” se produzem milhões de “derrotados”. Não se trata de competência ou dedicação, pois o que, nesse jogo viciado, os privilegiados jogam de mão e o acaso (ou o azar) é a regra para a grande maioria. Não há como “vencer pelo esforço”, por mais “heroico” e “empreendedor” que se seja.
No mundo real, não há “vencedores”, pois todos perdemos. Apostar somente em si mesmo não é um caminho para o sucesso, mas, ao contrário, receita quase infalível para o fracasso.
A melhoria das condições de vida e trabalho acontece sempre de forma coletiva e o bom resultado depende da luta obstinada de muitos, de sua coragem, de sua esperança em um futuro melhor. Pois é exatamente isso que nos mostra a história. Se os trabalhadores têm, hoje, direito à limitação da jornada de trabalho, salários mínimos garantidos por determinadas horas trabalhadas, condições de trabalho dignas e protegidas contra riscos laborais, direito de representação sindical e à negociação coletiva; tudo isso deveu-se, não a espertas negociações individuais, mas à incessantes e encarniçadas lutas coletivas, lideradas pelos sindicatos; arma forjada no bojo das próprias lutas; ferramenta de transformação a serviço dos que efetivamente constroem a riqueza e o progresso e que, sem a união e a solidariedade de seus iguais, nada têm a ganhar pois, isolados, não tem qualquer poder de barganha.
Sem a consciência do passado, pode-se pensar que pagar contribuição sindical equivale a pagar mensalidade de um clube social ou de futebol. Mas disso não se trata. Em um clube social, troca-se dinheiro por serviços; o sindicato não oferece apenas “serviços”, mas é o bastião que assegura a permanência dos direitos dos trabalhadores e o aríete[1] para conquistas futuras. Em um clube de futebol, apoiamos materialmente a expressão de uma paixão; o sindicato é mais que uma escolha sentimental, pois contribuir materialmente para a entidade que representa os mais caros interesses da classe trabalhadora é uma opção racional, verdadeiro investimento para o futuro menor, individual e coletivo, de cada trabalhador.
Pois, para isso servem os sindicatos: continuar lutando coletivamente, com coragem e com esperança.
Luiz Alberto de Vargas
Desembargador do Trabalho, professor da Femargs e da Escola Trabalho e Pensamento Crítico, membro da AJD
[1]uma antiga máquina de guerra que foi largamente utilizado nas Idades Antiga e Média, para romper muralhas ou portões de castelos, fortalezas e povoações fortificadas. Em: https://dicionario.priberam.org/ar%C3%ADete.