Diogo Corrêa
Eleição para direção de escola é inconstitucional?
Já faz um tempo que isso ocorreu, mas acho que falar de democracia é sempre atual, ainda mais quando envolve questões jurídicas (foco do projeto “JuridiQuê?”).
Confesso que fiquei surpreso e achei meio absurda a ideia de que um processo de eleição para direção de escola pública pudesse ser considerado inconstitucional. Critiquei e dei razão a um grupo de professores de Parobé/RS que estavam insatisfeitos com a revogação de uma lei que oportunizava as eleições naquele município.
Afinal de contas, a eleição para diretores contribuiria para a participação de todos da escolha de rumos da escola, possibilitando que a comunidade, os pais, funcionários, professores e alunos exercitassem a democracia dentro da escola.
E não estava errado. Aqui entramos na questão dos atos discricionários do gestor público. Quando o governante entende que essa é uma iniciativa acertada para aproximar a comunidade escolar das decisões e quer democratizar o processo na raiz, pode ele, discricionariamente, optar por eleições e não escolha direta. Até aqui tudo constitucional.
Outra história, é quando outro governante assim não entende o que seja a “Gestão Democrática” e quer ele escolher o diretor(a). Quer ter essa prerrogativa na sua mão, não da comunidade escolar. Se uma lei (constitucional e bonitinha) contraria esse desejo, só aí temos inconstitucionalidade.
É o que já foi julgado pelo Supremo Tribunal Federal: violação da competência exclusiva do chefe do Poder Executivo[1]. E só se torna inconstitucional a partir da proposição da ação específica ou da atividade legislativa (como foi o caso de Parobé).
Reforço a ponderação: havendo um governante mais aberto à gestão compartilhada com a comunidade, mais democrático mesmo, poderia ele (dentro do seu poder discricionário) propor eleições para esses cargos. Por que não?
Embora não possa ser considerado fundamento para diminuir esse debate que é central, pensemos o seguinte: A indicação de uma pessoa para ocupar o cargo de diretor aniquila a democracia na escola? Assim como a eleição para prefeito(a), a participação democrática não pode se encerrar no voto. É preciso ser construída dia-a-dia.
Democratização da gestão do ensino público, deve obedecer aos princípios da participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola. Além deles, a comunidade escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes devem participar.
Sim. Sei que a democracia depende muito das possibilidades criadas pelo gestor e quando ele não quer ser democrático, a coisa complica. Democracia não é fácil mesmo. A Gestão Democrática deve ser constituída por meio da participação ativa com a comunidade escolar e a escola, por dentro dos conselhos escolares, nos colegiados e nos grêmios estudantis, onde sejam garantidas a liberdade de expressão, de pensamento, de criação e de organização coletiva da escola.
É preciso ampliar e conectar os espaços democratizantes: comunidade, por meio de associação de bairro, as ONGs e as entidades comunitárias etc. Participação e integração.
A eleição de diretores caracteriza-se como um instrumento de democracia sendo uma das melhores categorias para o provimento do cargo de gestor escolar. No entanto, é preciso entender que a escolha de gestores por eleição não é a solução para todos os problemas da escola e não garante que realmente haja uma gestão democrática[2].
Posto isso, dirijo-me ao movimento de professores e pais que ficaram insatisfeitos com a revogação dessa lei: não esmoreçam! A luta por democracia é diária e a mobilização de vocês foi exemplo disso e pode (deve) seguir para criar verdadeiramente a Gestão Democrática prevista na LDB[3]
A Lei Municipal nº 3.775-2018 (que define a estrutura organizacional do município) no inciso XVII do artigo 27 define que cabe à Secretaria da Educação promover a democratização da gestão municipal. O Plano Municipal de Educação (2014/2025)[4] diagnosticou que as escolas municipais contam com CPMs (Círculos de Pais e Mestres), com representações de pais, professores e funcionários das escolas, não possuindo Conselhos Escolares (ainda). Ou seja, a aplicação desse plano e da lei citada são questões a serem cobradas da administração, apontando os caminhos a serem trilhados nessa temática.
Democracia requer construção.
Diogo Corrêa
Equipe JuridiQuê. Servidor Público. Bacharel em Direito pela Universidade Feevale e Mestre em Desenvolvimento Regional pela FACCAT.
[1]No caso a Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, artigo 213, § 1º, estaria sendo contrariada, além das Leis estaduais nºs 9.233 e 9.263, de 1991. A Constituição Federal estaria sendo desrespeitada no seus artigos 2º (separação dos poderes), 37, II (cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração) e 84, II (exercício de direção pelo gestor) e XXV (nomeações). [2] PARO, Vitor Henrique. Eleição de diretores: a escola pública experimenta a democracia. São Paulo: Xamã, 2003. [3] A LDB, artigos 14, apresenta as seguintes determinações, no que se refere à gestão democrática: Art. 14 - Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I. Participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II. Participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. [4] https://parobe.atende.net/atende.php?rot=1&aca=119&ajax=t&processo=viewFile&ajaxPrevent=1618714890232&file=8291B9595B1ED6E8DD677BDEBF2C34D01BE3D107&sistema=WPO&classe=UploadMidia